Segurança e Saúde ocupacional: A prevenção do ruído

Data de publicação : 27/11/2023

Introdução

O meio ambiente físico nos proporciona sensações captadas pelos cinco sentidos (visão, audição, olfato, paladar e tato) e processadas pelo sistema neural, responsável por produzir respostas a ações voluntárias ou involuntárias. Os estímulos de sons percebidos pelo pavilhão auditivo (orelha) causam sensações agradáveis ou perturbadoras, as quais, dependendo da intensidade e do tempo de exposição, podem ser nocivas à saúde e provocar perda de audição pelo agente ruído (OIT, 1977).

Em ambientes de trabalho como indústrias de transformação, ruídos difusos ou pontuais, de fonte específica, são frequentemente encontrados, estando entre os mais prevalentes fatores de risco ocupacional, segundo a Organização Mundial da Saúde e a Organização Internacional do Trabalho (WHO; ILO, 2021).

De acordo com resultados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, 32,1% dos trabalhadores brasileiros estão expostos ao ruído ocupacional, representando um índice maior do que outros países latino-americanos como a Argentina (16,7%), Costa Rica (20,5%) e El Salvador (25,8%) (ASSUNÇÃO; ABREU; SOUZA, 2019).

Além dos profissionais das áreas de manufatura, músicos e profissionais de áudio, profissionais de telemarketing, profissionais de saúde (dentistas e enfermeiros), da construção civil, da agricultura, do setor de transportes (aéreo, rodoviário e ferroviário), concertos e shows ou mesmo escolas são exemplos de ocupações e locais sujeitos a níveis elevados de ruídos.

Os ruídos ocupacionais podem ser contínuos, com pouca ou nenhuma variação, intermitentes, com oscilações de intensidade, e de impacto, com picos que duram menos de 1 segundo (MTE, 1978). Abaixo, seguem alguns exemplos do nível de pressão sonora (NPS) em situações do cotidiano comparativamente ao nível de conforto acústico definido por normas brasileiras:

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da Universidade Trisul

 

Uma Questão de Saúde Pública

A poluição sonora difusa presente no meio ambiente urbano é considerada um problema de saúde pública mundial, uma vez que 10% da população do globo está exposta a níveis de ruído que podem causar doenças graves, inclusive perda auditiva induzida por ruído (PAIR) – redução gradual e progressiva da acuidade auditiva, decorrente de exposição continuada a níveis elevados de pressão sonora (WHO, 2011; INSS, 1997).

No Brasil, o arcabouço legal sobre o tema é robusto, abrangendo as esferas Federal, Estadual e Municipal. A Constituição Federal defende o meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida. A Lei de Crimes Ambientais estabelece ser crime causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que possam resultar em danos à saúde humana, à fauna e à flora. A Resolução nº 002/1990 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) dispõe sobre o Programa Nacional de Educação e Controle da Poluição Sonora, cabendo aos Estados e Municípios a implementação de programas de educação e controle da poluição sonora, conforme o Programa Silêncio.

Maus Hábitos e Sintomas

Além das condições de exposição ao ruído nos ambientes de trabalho e nas cidades de maior porte, maus hábitos como assistir televisão e utilizar fones de ouvido em volume alto, o descuido com a higienização e infecções mal curadas na região auricular podem ser motivos para o desencadeamento de doenças auditivas.

A exposição ao ruído excessivo pode apresentar diversos sintomas no organismo como irritabilidade, ansiedade, dor de cabeça, zumbido, tontura, estresse, falta de concentração, comprometimento cognitivo, perda de memória, dificuldades no entendimento da fala e de comunicação, fadiga ocular, insônia, doenças cardiovasculares e, em um estágio mais gravoso, perda auditiva irreversível.

Prevenir é cuidar!

O conforto acústico nos ambientes de trabalho é obtido ao se manter o ruído em um limite de tolerância (LT) estabelecido por normas técnicas de Higiene Ocupacional que limitam o valor do ruído contínuo ou intermitente em 85 decibéis (dB), com exposição a 8 horas de trabalho, sem o uso de proteção auditiva (MTE, 1978). Atividades ou operações que exponham os trabalhadores a níveis de ruído, contínuo ou intermitente, superiores a 115 dB, sem proteção adequada, oferecem risco grave e iminente (MTE, 1978).

Por serem objeto de criterioso estudo técnico, as avaliações deste risco físico nos ambientes são realizadas por profissionais com formação técnica ou em engenharia, especializados no tema. Já o nexo ocupacional da PAIR é realizado por profissionais de medicina por meio de anamnese clínica, avaliação do histórico ocupacional, avaliação audiológica, avaliação da eficácia dos protetores auditivos, avaliação das medidas de controle administrativas e de engenharia e, se necessário, testes complementares (FUNDACENTRO, 2018).

 

Nas cidades, o conforto acústico é definido por normas de avaliação de níveis de pressão sonora em áreas habitadas, visando o conforto da comunidade, e em ambientes internos das edificações, NBR 10.151 e NBR 10.152, respectivamente.

Nos espaços residenciais, a norma NBR 15.575 ainda define orientações para edificações habitacionais, que incluem requisitos de desempenho de qualidade e segurança em vedações verticais internas e externas, nos sistemas de pisos, coberturas e hidrossanitários, de forma a garantir, entre outros, o conforto acústico.

Reconhecimento e Controle

A manutenção da saúde geral requer cuidados e atenção contínuos, seja nos ambientes laborais, públicos ou privados. No que diz respeito à saúde ocupacional, como ações preventivas e de controle aos agentes de risco deve-se adotar, nessa ordem: (1) medidas de proteção coletiva, (2) medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho e (3) utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI).

Quanto à saúde auditiva, medidas de proteção coletiva compreendem soluções técnicas e de engenharia, tais como: instalação de barreiras acústicas (paredes e tetos), enclausuramento das fontes de ruído, projeto de ambientes que separem o trabalhador da fonte emissora ou uso de equipamentos de proteção coletiva (EPC).

Medidas administrativas e de organização do trabalho podem ser: limitação do tempo de exposição do trabalhador ao ruído, realização de campanhas de educação e conscientização sobre os riscos, realização de exames audiométricos periódicos, programação de revezamento de trabalhadores em local ruidoso.

Fornecer EPI adequados e aprovados pelo órgão nacional competente em matéria de Segurança e Saúde no Trabalho (SST): protetor auditivo circum-auricular (abafador tipo concha), protetor auditivo de inserção (tipo plug), protetor auditivo semi-auricular (tipo capa) para proteção do sistema auditivo contra níveis de pressão sonora superiores ao estabelecido na Norma Regulamentadora do Ministério do Trabalho, NR-15.

Riscos em Ambientes de Ensino e Aprendizagem

As políticas de SST apoiam e aprimoram a missão acadêmica (Ensino, Pesquisa e Extensão) e não a limita. Embora o ambiente acadêmico seja distinto da indústria em quase todos os aspectos, grandes instituições podem ser comparadas a pequenas cidades onde uma população vive e trabalha, nas quais questões de segurança pessoal e comunitária interagem com questões de Segurança e Saúde Ocupacional (ILO, 1998).

Escolas ou faculdades que oferecem somente programas teóricos, que não requerem atividades práticas em laboratórios, podem ter relativamente poucos riscos, enquanto universidades, com programas mais abrangentes e com escolas de medicina, engenharia e/ou ações, projetos e programas de pesquisa e extensão podem apresentar riscos altamente perigosos, como produtos químicos tóxicos, riscos biológicos, radiações ionizantes e não ionizantes e vários outros agentes físicos.

Novos tempos: Silêncio e Saúde

O mundo do trabalho tem sido desafiado na medida em que fatores como a tecnologia, novos modos de organização do trabalho, extinções de profissões e o surgimento de outras, e temas de ordem como o Desenvolvimento Sustentável operam grandes mudanças nos processos produtivos, com impactos positivos na preservação do meio ambiente natural e do construído, visando condições saudáveis e segura para todos.

Em tempos de pandemia, principalmente durante o isolamento social e períodos de quarentena, foi necessário reduzir o ritmo e/ou a forma de realizar as atividades consideradas não essenciais, diminuindo o fluxo das pessoas, do trânsito e dos ruídos nas cidades. Se por um lado vivemos um estado de calamidade em saúde pública, por outro, observou-se a redução da poluição atmosférica e da poluição sonora, fatores estes importantes para a saúde e qualidade de vida do trabalhador e que devem ser considerados no dia a dia das pessoas, mesmo após a pandemia.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10.151 – Acústica – Medição e Avaliação de níveis de pressão sonora em áreas habitadas – Aplicação de uso geral. Rio de Janeiro: ABNT, 2020.

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10.152 – Níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro: ABNT, 2017.

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 15.575-1 – Edificações Habitacionais – Desempenho. Parte 1: Requisitos gerais. Rio de Janeiro: ABNT, 2021.

ASSUNÇÃO, A. A.; ABREU, M. N. S.; SOUZA, P. S. N. Prevalência de exposição a ruído ocupacional em trabalhadores brasileiros: resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cadernos de Saúde Pública. v. 35, n. 10, 15p., 2019. Disponível em: https://www.scielosp.org/article/csp/2019.v35n10/e00094218/.Acesso em: 09 out. 2021.

ATLAS, Equipe. Segurança e Medicina do Trabalho. Editora Atlas. 86ª ed. 2021, 1024p.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 2 out. 2021.

BRASIL. Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Lei de Crimes Ambientais. Disponível em: http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 2 out. 2021.

CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resolução CONAMA nº 002, de 08 de março de 1990. Dispõe sobre o Programa Nacional de Educação e Controle da Poluição Sonora – Silêncio. Disponível em: http://conama.mma.gov.br/atos-normativos-sistema. Acesso em: 09 out. 2021.

FUNDACENTRO. Guia de diretrizes e parâmetros mínimos para a elaboração e gestão do Programa de Conservação Auditiva (PCA). São Paulo. 109p. 2018.

ILO – International Labour Organization. Encyclopaedia of Occupational Healthy & Safe. Part VI – General Hazards – Noise. Disponível em: https://www.iloencyclopaedia.org/part-vi-16255/noise. Acesso em: 05 out. 2021.

INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social. Portaria do INSS com Respeito à Perda Auditiva por Ruído Ocupacional. Edital nº 3, de 9 de julho de 1997. Disponível em: http://arquivosdeorl.org.br/additional/acervo_port.asp?id=26#:~:text=Como%20regra%20geral%2C%20%C3%A9%20tolerada,ou%20 120%20db(C). Acesso em: 08 out. 2021.

MTE – Ministério do Trabalho. Portaria MTB nº 3.214, de 08 de junho de 1978. Aprova as Normas Regulamentadoras do Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do Trabalho, relativas a Segurança e Medicina do Trabalho. Disponível em: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=181059.

Acesso em: 10 out. 2021.

OIT – Organização Internacional do Trabalho. Convenção N. 148 – Contaminação do Ar, Ruído e Vibrações. Brasília: 1977. Disponível em: https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236121/lang--pt/ index.htm. Acesso em: 07 out. 2021.

WHO – World Health Organization. Regional Office for Europe. JRC European Commission. Burden of disease from environmental noise: Quantification of healthy life years lost in Europe. 126p. 2011. WHO – World Health Organization; ILO – International Labour Organization. Joint Estimates of the Work-related Burden of Disease and Injury, 2000-2016: Global Monitoring Report . 92p. Geneva: 2021. Disponível em: https://www.ilo.org/brasilia/noticias/WCMS_820318/lang--pt/index.htm. Acesso em: 08 out. 2021

Fonte: novembro-seguranca_saude_ruido.pdf (ifes.edu.br)